quarta-feira, outubro 31, 2007

DOIS ALGARVES: O Interior e o Litoral...







DOIS ALGARVES – O Caso de Alcoutim



(Texto de Nuno Silva)

No outro dia, tive a oportunidade de assistir a uma reportagem cujo objectivo era mostrar a vida das pessoas em Alcoutim, contrastando com o que se passava em Albufeira. Foi, por assim dizer, uma excelente oportunidade para verificarmos, com testemunhos reais, um Algarve com duas velocidades, manifestamente distintas.


Enquanto em Albufeira os seus habitantes destacaram a vida intensa, própria de uma média/grande cidade, e também toda a panóplia de eventos e faculdades, que de uma forma ou de outra lhe deram mais vida, em Alcoutim, lamentaram-se oportunidades perdidas e meditou-se muito sobre qual o futuro que lhes estava reservado. Urge parar um pouco neste último caso para estendermos esta meditação. Alcoutim é um dos concelhos mais pobres do Algarve e quiçá do próprio sul de Portugal. Apesar do esforço notável do Dr. Francisco Amaral, ilustre presidente da autarquia, e restantes autarcas, na prossecução de mais obras e mais atenção para os alcoutenejos, sabemos que muitos, precisamente aqueles que mais deveriam ajudar, têm-se esquecido deste concelho que vive paredes meias com uma Espanha que cresce a olhos vistos e com o Alentejo, também ele pobre e desamparado.

Creio que é chegada a hora de berrar porque já não se pode ficar apenas pelo grito de alerta. Tal como dizia alguém naquela reportagem, para combater a diminuição de pessoas, ajudando-as a ficar, já não vamos a tempo. Porventura, já vamos tarde demais. Por isso, só falta mesmo berrar, de uma forma persistente e bem audível. Esta coisa do politicamente correcto, por vezes, não resulta.

E, face ao abandono e aos dados preocupantes que são recolhidos periodicamente, não sei se já não terão condenado alguns locais ao desespero e má fortuna definitiva. Mas, enquanto ainda há vida, há esperança. Urge então falar claro sem preconceitos.

É necessária uma discriminação positiva urgente, para que possamos estancar o que ainda for possível. E quando escrevo discriminar, defendo uma postura que não se resigne a um conjunto de medidas avulsas, muitas vezes sem pró actividade nenhuma, apenas fruto de circunstâncias temporais. Estamos um pouco fartos da inércia e da entrega voluntária de locais a um destino sem conteúdo algum, e que apenas fere a memória de gerações que cresceram e constituíram família.

Hoje, apesar de votados ao abandono, ainda conseguimos, se quisermos, dar-lhes uma nova vida, assim sejamos audazes e criativos nas políticas a seguir.

Dir-me-ão alguns que fazer com que o interior volte a viver de novo é uma tarefa inexequível. Se assim for, terei de relembrar a certas mentes mais centralizadoras, que quando estivermos todos nas grandes urbes e olharmos para um país encolhido e cheio de oportunidades perdidas, estaremos a ser um Portugal diminuído em vez de fortalecido. É uma questão de escolher.




Depois deste texto ilustrativo e alarmante sobre o nosso Interior Esquecido, deixo aqui o meu testemunho sobre o maravilhoso recanto, que é a vila de Alcoutim. Leiam e desfrutam através do imaginário, todo um local mágico e único do nosso Algarve Profundo.


Alcoutim e arredores

Vila simpática, à Beira rio e com vista para a vizinha Espanha. Alcoutim, terra algarvia, que nasceu e cresceu na margem direita do rio Guardiana.

A presença humana no território que actualmente existe no concelho de Alcoutim poderá remontar ao Paleolítico Médio, pois foram descobertos vestígios arqueológicos deste período, na freguesia do Pereiro. Mas terá sido a partir do Neolítico (5.000 a.C. a 3.000 a.C) que as populações construtoras de megálitos se fixaram um pouco por todo o território de Alcoutim. Testemunhos dessa presença são os vários exemplos de monumentos megalíticos espalhados pelas cinco freguesias. Antas, menires, tholos ou cistas megalíticas merecem uma visita.

Testemunhos:

Situado entre as povoações das Cortes Pereiras e Afonso Vicente, o Conjunto Megalítico do Lavajo (3500 a.C.) é constituído por um alinhamento de três menires e quatro estelas menires que distam entre si cerca de 250 metros. O local encontra-se devidamente musealizado e com sinalética indicadora. Os objectos ali encontrados poderão ser vistos no núcleo de arqueologia em Alcoutim.

A cerca de um quilómetro, em linha recta, deste local identificou-se um interessante monumento funerário – A Anta do Malhão. A anta está situada no topo da elevação mais proeminente de toda uma vasta região, junto da Estrada Municipal 507 e em frente da povoação de Afonso Vicente. O monumento encontrava-se inviolado, retratando uma situação raríssima, só excepcionalmente verificada em Portugal.

A confirmação da continuidade de comunidades humanas, são as necrópoles de cistas da Idade do Bronze e do Ferro.

Quanto ao Período Romano: são inúmeros os vestígios que nos dão a conhecer a existência de comunidades organizadas em núcleos habitacionais ou núcleos familiares. Sobretudo na zona litoral, onde se situam maioritariamente os melhores terrenos agrícolas, e é comum detectar essa presença romana, onde o Guadiana constituia uma grande atracção como via de penetração das rotas comerciais, que ligavam esta terra a todo o mediterrâneo.

Testemunhos:

Barragem Romana do Álamo e a Villa Romana do Montinho das Laranjeiras. (clique para ver imagens)

A Barragem Romana do Álamo, construída em opus incertum (através de cofragem, onde no interior era depositada uma espécie de “pasta” de areia pedras e argamassa), possui cerca de 40 metros de comprimento e seis contrafortes tendo actualmente a altura máxima de 3 metros (e que deve estar próxima da altura máxima inicial).
Em 1877, quando foi descoberta, detectaram-se igualmente outros edifícios com os quais poderá estar relacionada. Um deles, formado por vários compartimentos, com dois tanques contíguos, é considerado uma oficina, talvez uma tinturaria, a qual exigiria um consumo constante de água. O outro poderá ter sido um templo, dado terem-se encontrado, além das sepulturas escavadas nos pavimentos, restos de três estátuas. A barragem está classificada como Monumento de Interesse Público desde 1991.

Villa Romana do Montinho das Laranjeiras (séc. I a.C. a séc. XII/XIII). Monumento classificado de Imóvel de Interesse Público (2004), tem uma ocupação desde o Período Romano até pelo menos o séc. XII ou XIII. A estação arqueológica apresenta ruínas de compartimentos romanos, uma igreja cruciforme visigótica, com influências orientais do séc. VI/VII, e parte de pelo menos duas casas rurais islâmicas, que poderão ter sido ocupadas até à reconquista cristã no século XIII.

A presença visigótica é evidente em Alcoutim, algumas mesmo, numa continuidade de ocupação dos mesmos espaços romanos, como se pode ver na Estação Arqueológica junto a Montinho das Laranjeiras, sensivelmente a oito quilómetros a sul da vila de Alcoutim.

A freguesia de Alcoutim é constituída por dezassete núcleos habitacionais, ou “montes”: Afonso Vicente, Álamo, Balurcos, Corte das Donas, Cortes Pereiras, Corte da Seda, Corte Tabelião, Cruzamento, Guerreiros do Rio, Laranjeiras, Marmeleiro, Montinho das Laranjeiras, Palmeira, S. Martinho, Santa Marta, Torneiro e Vascão.

O seu castelo (foto aqui) fica no cimo do monte, com uma vista lindissima para o rio e para San Lúcar, vila espanhola. Foi construído nos primórdios do século XIV, durante o reinado de D. Dinis, com a clara intenção de criar numa zona de fronteira uma “linha de detenção”, ou pelo menos de vigia. Anteriormente em ruinas, hoje totalmente restaurado, com jardins e muitas sombras, é um lugar agradável de se passar uma tarde de Verão. Na muralha norte construíram um museu arqueológico,onde está uma exposição permanente do paleolítico até aos canhões medievais, que eram utilizados como protecção do castelo.

Autoria: Ategina








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